O incentivo ao uso de transportes públicos passa não só pela qualidade e preço do serviço prestado mas também pela mudança de mentalidades. Infelizmente, no nosso país, andar de transportes públicos ainda é um estigma e sinónimo de ‘segregação’ social. As classes média e média alta (será que isso ainda existe?) associam o uso de viatura particular a um estatuto superior e consecutivamente, o uso de transportes públicos a uma despromoção social ou situação económica mais frágil. O carro é sinónimo de sucesso e estabilidade financeira e corresponde, na maior parte dos casos, ao primeiro empréstimo contraído pelas famílias ou indivíduos.
Ainda que consiga aceitar argumentos de que os horários não são respeitados e muitas vezes as condições para os utentes não são as melhores, continuo a achar incompreensível o factor do peso social na equação. Querem-me convencer de que é preferível estar nas filas de trânsito horas a fio, com progressos de 1 ou 2 metros a cada 5 minutos do que ir sossegado no comboio, autocarro ou metro a ler o jornal e a apreciar a paisagem?
Nas grandes cidades europeias é comum verem-se pessoas de todos os estratos sociais nos transportes públicos. Enquanto se dirigem para o respectivo local de trabalho preparam reuniões, revêm relatórios, estudam, lêem romances, ouvem música. Casos como o da cidade de Nova Iorque, são louváveis. Segundo a Wikipédia, apenas 48% de nova-iorquinos possuem carro (em Manhattan, o número de pessoas sem viatura própria ascende a 75%). No entanto, destes, são menos de 30% aqueles que o utilizam para se deslocar até ao trabalho, a maioria acha mais conveniente e económico usar os transportes públicos para essa finalidade, evitando assim as filas de trânsito intermináveis.
Perante a crise que o país atravessa, muitos são os cidadãos que optam por transportes públicos, apesar dos recentes aumentos de preços, a verdade é que, ainda assim, e com a subida exponencial dos preços dos combustíveis, apresentam-se como uma boa alternativa ao uso de viatura própria.
Bons exemplos começam a surgir um pouco por todo o país. No metro do Porto a qualidade e excelência dos serviços têm vindo a conquistar cada vez mais utentes. Desde os traçados com carris implantados em superfícies verdurizadas e arranjo das áreas envolventes, até ao desenho de estações por arquitectos de renome e carruagens topo de gama, nada foi deixado ao acaso. E, um pouco por toda a Europa especialistas em mobilidade e regeneração urbana citam-no como exemplo a seguir e deslocam-se ao Porto para apreciar in loco as mais valias do sistema. Em Lisboa começa a ser implementado o sistema Park & Ride, os utentes são convidados a deixarem o carro em parques de estacionamento na periferia da cidade e a virem trabalhar para o centro de transporte público. É óbvio que cito estes exemplos analisando apenas os resultados de satisfação, adesão de utentes e regeneração urbana e não o historial de gestão calamitosa destas empresas.
Ao serem reduzidos o número de carros nos centros urbanos, reduzem-se também as cifras de poluição, protege-se o património histórico e é dada prioridade aos peões e bicicletas incentivando a regeneração de comércio nestas áreas.
O certo é que, enquanto os restantes países europeus têm uma aposta clara no reforço e melhoria das redes de transportes públicos, nomeadamente as redes ferroviárias, nos países em crise assistem-se a cortes selvagens e à supressão de conexões importantes.
Enquanto nas grandes cidades são implementados projectos inovadores, a nível da mobilidade nacional os projectos deixam muito a desejar e numa época de crise avizinham-se cortes que ameaçam ostracizar, ainda mais, as populações do interior.
Deveriam ser previstas opções que abrissem portas à mobilidade da população e fossem de encontro às necessidades do país. Por exemplo, é normal no centro da Europa que trabalhadores viajem 30 minutos a 1 hora em transportes públicos para irem trabalhar. Cabe, muitas vezes, ao empregador pagar os passes mensais do trabalhador mas, em contrapartida, é premiado com benefícios fiscais. Uma pessoa que vive em Aveiro poderia, facilmente, deslocar-se até ao Porto para trabalhar e perder o mesmo tempo que perde diariamente nas filas de trânsito, em hora de ponta, dentro da própria cidade. Outro fenómeno interessante prende-se com o facto de que, ao utilizarem este método, as empresas tenderem a posicionar-se perto das estações ferroviárias, facilmente acessíveis e, geralmente, em pleno centro histórico, dinamizando áreas que de outra forma estariam abandonadas ou deterioradas.
Para incentivar a procura de emprego e a mobilidade de trabalhadores, poder-se-iam implementar reduções de tarifas, nos transportes públicos, mediante comprovativos de entrevistas de emprego. Ou mesmo reduções para famílias numerosas como estímulo às políticas de incentivo à natalidade.
Agilize-se a mobilidade de pessoas e bens para aumentar a competitividade e solucionar problemas estruturais.
Mas o governo prefere apostar no mercado privado onde o investimento do estado é praticamente nulo e as vantagens enormes. Os impostos sobre os combustíveis e o mal afamado Imposto Automóvel, agora denominado Imposto sobre Veículos, fazem parte de um hábil sistema de tributação. A título de exemplo, em Janeiro de 2008, um Volvo V50 D5 custava em Portugal €49.100,00 enquanto que em Espanha custava €34.275,00 e na Suécia €28.545,00. De relembrar que os preços base são iguais e o mesmo se passa com os combustíveis, a diferença é que no nosso país o estado mete mais dinheiro ao bolso.
E por agora deixo-vos, tenho de ir visitar uns amigos e já estou atrasada para levantar a minha viatura de Carsharing.
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