Já não há heróis como King

31 Ago

Paradigma. A palavra da moda e que não sai de moda em ciências sociais, da sociologia à comunicação, passando pela filosofia e outras sofias. Vem isto a propósito de outra palavra do momento, lançada já não se sabe bem por quem e recuperada dos tempos bafientos de Salazar: o assistencialismo. Vem isto a propósito do novo programa “Plano de Emergência Social” do ministro Pedro Mota Soares, que até já li no Facebook ser “o melhor ministro da Segurança Social que Portugal já teve” (e viva a estreiteza de vistas e de perspectiva histórica).

Os críticos da coligação, que são cada vez mais, acusam a ideia do ministro, uma das pedras de toque propaladas pelo então candidato Fernando Nobre antes da campanha eleitoral, de cheirar a mofo e de ser uma caridadezinha cristã para com os pobrezinhos deste país. E por falar na Igreja, o padre Vítor Melícias, o tal que tem uma pensão de mais de sete mil euros, veio logo dizer: “Não podemos dar restos aos pobres; os restos dos medicamentos, por exemplo”.

A verdade é que algo tem que ser feito. O país está em desequilíbrio gritante, há muitos anos, e continuam a ser os mais pobres a pagar a balança que pende apenas para um lado. São de novo esses que vão sofrer mais com o aumento do gás, da electricidade, dos transportes, da água quando for privatizada, dos correios quando seguirem o mesmo caminho (começando pelo IVA que agora vai passar a ser cobrado). Tal como na Idade Média, em que o objectivo era manter os escravos vivos, com força para trabalhar, e apenas e só isso.

O tão chamado ataque à classe média, que a coloca em perigo de extinção, prende-se com uma determinada pose e estilo de vida que passa por ter LCD’s, férias no Brasil, Blackberry’s e BMW’s. A esses, que agora se queixam de dificuldades, não me parece que seja devida qualquer compreensão ou razão.

Este estilo novo-rico está também nas mentalidades. Parece que agora o governo decidiu que todos os exames médicos passam a existir apenas em formato informático. Sim senhor, muito bem, excelente ideia, somos os maiores e mais uma vez lideramos o mundo na inovação. Agora gostava de ver como explicar a tantos e tantos velhotes perdidos nas aldeias de Portugal, e mesmo em aldeias paradas no tempo no centro de Lisboa ou Porto, gostava de ver explicado a esses cidadãos que de repente já não podem ver o estado da sua saúde, simplesmente porque uns senhores sentados à secretária, nados e criados no mundos das novas tecnologias, decidiram que sim. Que vamos poupar dinheiro? Vamos sim. Que vamos desrespeitar muitos cidadãos? Vamos sim senhor.

Mas honra seja feita a este governo. Voluntarismo há muito, por exemplo em Assunção Cristas, que no entanto, candidamente numa entrevista ao Expresso, reconhece que “caíu de pára-quedas” e que “felizmente” tem secretários de Estado que percebem do assunto.

Na ordem do dia está também o imposto sobre grandes fortunas, que Vítor Gaspar parece estar a levar a sério. A ideia não é dele, veio de Warren Buffet e de milionários franceses, mas é bom que Gaspar comece a interiorizar uma medida que é lógica.

Uma palavra final para um político a sério, que a sério mudou mentalidades e que a sério lutou por um mundo melhor. A 28 de Agosto de 1963, Martin Luther King disse ter um sonho e não se coibiu de dizê-lo alto e bom som. Pagou com a vida tal ousadia mas as coisas agitaram-se. O racismo ainda existe e é uma doença provavelmente sem cura mas a verdade é que Barack Obama inaugurou um memorial em honra de King no passado Domingo no National Mall, a gigantesca esplanada a sul da Casa Branca, em Washigton, o primeiro não dedicado a um antigo presidente ou a uma guerra. Já não há heróis como King.

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